A tinta branca


O racismo é tinta
e cada gota que sai do tinteiro mancha, sangra, corta
é uma plástica forçada
uma prática normalizada
um carimbo

Eles são o staff que controlam as entradas
te dão um crachá de aceito se você ficar calado
te dão a solidão e a recusa se você reclamar dos fatos

eu mostro dados
eu narro histórias
eu abro minha ferida e mostro as provas como Jesus fez com Tomé
eles veem e não creem
eles fazem e mentem
repetem e não sentem que o problema que criaram é um monstro com muitos braços
que expulsam, expurgam, perseguem
que abusam, anulam e cegam
nos tratam como escravos, mas eu os vejo como aqueles três macacos:
não quero ver
não quero escutar
não quero falar
fala só se for pra te humilhar
"eu mudei de rua pela minha segurança"
porque lá no fundo a desconfiança
nasceu do ensinamento repassado pelos seus pais
que também expulsaram, expurgaram e anularam
de pai pra filho
de pobre pra rico
e de branco pintaram Cristo
na maior mentira imagética que se pode contar
o adorado exemplo de vida
re-assassinado pelo estado casto
e repetem o castigo dele nos seus descendentes diretos
e de marcas e flagelos se faz um preto
criado e marcado desde cedo como abjeto
e até o algorítimo copiou o nobre préstamo
que o seu hábito não consegue dissimular
"cata as bolas", carrega e duvida
"como foi que você conseguiu trabalhar lá?"
o fiscal de cor com sua tinta em punho
o carimbo branco com seu serviço nulo
querem a comprovação da sua sobrevivência
num mundo que ele sabe que facilitou a sua prisão
e eu por cima grito: há de se fazer mais que isto
para apagar a tinta preta que assina a nossa libertação.

Willyane de P.
7. 2. 2020

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