Pela fresta

Ela entrou pela fresta
Ignorando meu recado de ausência
Será que me resta avisar
Que em minhas dependências os móveis estão empoeirados
Os vidros quebrados
E as paredes manchadas?
Será que ela não sabe das marginais que me invadiram
Tiraram o pó
E depois sumiram?
Deixando minha casa toda desconjuntada?

Mas ela vê pela fresta
Só um pouco da bagunça que há dentro
Vê no escuro o que me prendo
Em deixar desorganizado
Para não ter que ocupar-me em me encontrar
Ela não sabe que porta adentro o que me preenche é saber que, pela fresta, o que eu rezo é que ela quebre minhas paredes ou as decore
Que seja Dona daquilo que ficou
Que tire o mofo
Abra as minhas cortinas
E proteja os meus olhos se a luz dela me cegar
É que, veja, eu estou aqui há tanto tempo presa
Que talvez suas chaves se façam cadeados
E se me pego assim, solitária
É que essa casa parece mais segura que sua isca
Mas pode sentar
Tome esse chá
Quiçá eu me arrisque
E deixe que você ao menos piche esse cômodo
Talvez eu deixe que você seja visita
Nessa propriedade particular
Talvez eu alugue sem datas
E em minha morada você possa se alojar.

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