Capítulo III
A cidade estava mais cinza do que descrevem os uruguayos. Nao precisou sair porta afora para sentir. Ela está se preparando para o Natal, que sempre se repete, o ano novo, que só muda de número. Esperamos roupas novas, cabelo novo, projetos novos, sendo que trocar de datas sao so a continuidade da vida e dos mesmo vícios, dos mesmos amores. Você nao vai conseguir mudar sua vida somente pelo fato do relógio marcar meia noite e ser 1º de janeiro, e vir o carnaval, e vir o seu aniversário. Sempre se repete. A rotina do mundo, a ironia do comercio, das cancoes de fim de ano, onde a festa nunca vai ser sua, as alegrias nunca serao de todos. Sonhos só sao verdades se postos a prova no presente. Sonhar um futuro é traçar uma utopia em que esperamos ajuda de uma força maior para se concretizar. A força maior parte de sair do repouso das ilusoes e correr, andar devagar também, mas sair. Só chega-se ao destino se comprarmos as passagens desde a dedicacao. Fora isso, estou atrasada alguns capítulos. Na verdade, eu estava submersa nisso de que passa, mas sem me esforçar para passar. E demora. E demora muito. Um tempo que eu nao sei te dizer as horas.
Deixei meu relógio atrasado. Agora nao tenho que me importar com ele até 28 de janeiro. Eu poderia começar a fazer as malas das suas lembranças dentro de mim e despacha-las para bem longe. Eu nao iria cobrar o desvio. Seu desvio já me cobra todos os dias a certeza do incerto. Do pessimismo. Da irrealidade. Do improvável que por horas sinto, só de improviso, sorrir.
- Eles se preocupam comigo. (nem eu me preocupo mais)
Envelhecer nas metas, riscar algumas novas, mas ainda a minha habilidade de gerar planos, esta debilitada. É como se fosse conectada com meu coraçao que está incapaz de pensar num presente. Por isso penso em cair na ilusao de imaginar um futuro, mas sou ríspida e descrente demais pra tentar me auto-enganar.
Eu nao me pergunto mais o porque. Me refiro a você como uma religiao. Onde você acredita e por tempos deixa de acreditar. Onde era devota, todos os dias. Em velas, oferendas, danças, oraçoes, lágrimas. E ficava lá no meu altar. Te protegia como seguimento desse altar mor, como nas igrejas de Diamantina, que nao sei mais onde é. E como ateu, que descobriu um estupro do padre, um desvio de dinheiro do pastor, a mentira da cura de um falso medium, eu me ergo fora da cientificidade cética, porque essa combinacao de saudade e hormönios, e vontade, e libido, me faz odiar ainda mais qualquer transformacao química que envolva fluidos dentro de mim. Talvez essa seja nossa única conexao hoje. Carnal.
Acabo de mentir.
Ninguém sabe e as vezes nem eu, que tentei outra vez. E recebi o que só me afirmou que é um erro tentar "oitenta vezes", ridículo. Sabem o egoísmo? O amor próprio? Isso que eu recebi. E nao serei nenhum messias de dar a cara a tapa por mais de duas vezes. Três, sete, um ano e sete, que eu perdi as contas. O amor se foi, talvez, mas as contas nao sao físicas, as vezes ninguém vai ver, ou ler o que se passa em nossa emoçao, nao essa de espanto, porque ele já passou mas as vezes as sequelas queimam, ou azedam a festa, esquentam a cerveja na mao de esquecer de dançar e estar parada no meio de tantas pessoas e somente desejar a mim mesma. A minha volta la do Rio de la Plata. É burrice querer o retorno das lágrimas, portanto, que elas caem e que vao pelo curso da água na 18 de julio até chegar no esgoto, lugar de almas pobres e dessa energia ruim. O rio nao merece isso. E as ondas, as trariam outra vez. Eu quero que se vá com a chuva e que ninguém beba dessa fonta inesgotável que é a solidao de nós mesmos.
No fundo, eu estou triste comigo mesma, de ter acreditado naquilo que eu repudiava, de abandonar as defesas do meu sistema, qualquer que seja e tentar. Depois de ler que nao é possível um único soldado ganhar uma guerra sozinho, minha culpada humildade pediu sua ajuda pra erguer uma fortaleza...de papéis do meus escritos, das fotos, que eu nao queimei. Vou deixá-los expostos para nao esquecer, afinal, serao provas se um dia meu cérebro apagar da minha memória esse semestre. Viu? É um ciclo, é contraditório. Querer esquecer e nao relembrar para nao repetir. Meu condicionamento operante anda um pouco bifuso.
Mas sao só as merdas mesmas de ter sentidos, logicamente alinhados em sua primeira visao, seu primeiro abraço, o primeiro gos(t)o e lembranças boas e más dividem o mesmo espaço e penso no tempo e começo a entender. Tempo é vivência, logo, só com outras evidencias causais que poderei substituir as velhas...
Portanto, hoje eu vou sair pra rua. Nao importa se vai chover, nao importa se o vento da rambla vai me arremesar no asfalto, ou se tiverem alertas "rojo" de tempestade, nao vai estar pior do que dentro de mim, porque nao vou ter nada a perder, talvez a roupa molhada, uma maquiagem borrada, mas ser livre no escuro é beijar o por mim já conhecido, que dessa vez, nao quero saber o nome.
Montevideo, 2012.
Deixei meu relógio atrasado. Agora nao tenho que me importar com ele até 28 de janeiro. Eu poderia começar a fazer as malas das suas lembranças dentro de mim e despacha-las para bem longe. Eu nao iria cobrar o desvio. Seu desvio já me cobra todos os dias a certeza do incerto. Do pessimismo. Da irrealidade. Do improvável que por horas sinto, só de improviso, sorrir.
- Eles se preocupam comigo. (nem eu me preocupo mais)
Envelhecer nas metas, riscar algumas novas, mas ainda a minha habilidade de gerar planos, esta debilitada. É como se fosse conectada com meu coraçao que está incapaz de pensar num presente. Por isso penso em cair na ilusao de imaginar um futuro, mas sou ríspida e descrente demais pra tentar me auto-enganar.
Eu nao me pergunto mais o porque. Me refiro a você como uma religiao. Onde você acredita e por tempos deixa de acreditar. Onde era devota, todos os dias. Em velas, oferendas, danças, oraçoes, lágrimas. E ficava lá no meu altar. Te protegia como seguimento desse altar mor, como nas igrejas de Diamantina, que nao sei mais onde é. E como ateu, que descobriu um estupro do padre, um desvio de dinheiro do pastor, a mentira da cura de um falso medium, eu me ergo fora da cientificidade cética, porque essa combinacao de saudade e hormönios, e vontade, e libido, me faz odiar ainda mais qualquer transformacao química que envolva fluidos dentro de mim. Talvez essa seja nossa única conexao hoje. Carnal.
Acabo de mentir.
Ninguém sabe e as vezes nem eu, que tentei outra vez. E recebi o que só me afirmou que é um erro tentar "oitenta vezes", ridículo. Sabem o egoísmo? O amor próprio? Isso que eu recebi. E nao serei nenhum messias de dar a cara a tapa por mais de duas vezes. Três, sete, um ano e sete, que eu perdi as contas. O amor se foi, talvez, mas as contas nao sao físicas, as vezes ninguém vai ver, ou ler o que se passa em nossa emoçao, nao essa de espanto, porque ele já passou mas as vezes as sequelas queimam, ou azedam a festa, esquentam a cerveja na mao de esquecer de dançar e estar parada no meio de tantas pessoas e somente desejar a mim mesma. A minha volta la do Rio de la Plata. É burrice querer o retorno das lágrimas, portanto, que elas caem e que vao pelo curso da água na 18 de julio até chegar no esgoto, lugar de almas pobres e dessa energia ruim. O rio nao merece isso. E as ondas, as trariam outra vez. Eu quero que se vá com a chuva e que ninguém beba dessa fonta inesgotável que é a solidao de nós mesmos.
No fundo, eu estou triste comigo mesma, de ter acreditado naquilo que eu repudiava, de abandonar as defesas do meu sistema, qualquer que seja e tentar. Depois de ler que nao é possível um único soldado ganhar uma guerra sozinho, minha culpada humildade pediu sua ajuda pra erguer uma fortaleza...de papéis do meus escritos, das fotos, que eu nao queimei. Vou deixá-los expostos para nao esquecer, afinal, serao provas se um dia meu cérebro apagar da minha memória esse semestre. Viu? É um ciclo, é contraditório. Querer esquecer e nao relembrar para nao repetir. Meu condicionamento operante anda um pouco bifuso.
Mas sao só as merdas mesmas de ter sentidos, logicamente alinhados em sua primeira visao, seu primeiro abraço, o primeiro gos(t)o e lembranças boas e más dividem o mesmo espaço e penso no tempo e começo a entender. Tempo é vivência, logo, só com outras evidencias causais que poderei substituir as velhas...
Portanto, hoje eu vou sair pra rua. Nao importa se vai chover, nao importa se o vento da rambla vai me arremesar no asfalto, ou se tiverem alertas "rojo" de tempestade, nao vai estar pior do que dentro de mim, porque nao vou ter nada a perder, talvez a roupa molhada, uma maquiagem borrada, mas ser livre no escuro é beijar o por mim já conhecido, que dessa vez, nao quero saber o nome.
Montevideo, 2012.
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